quinta-feira, 13 de novembro de 2014

NEJM: Triagem genética de doenças

Screening an Asymptomatic Person for Genetic Risk — Polling Results


O New England Journal of Medicine publicou em seu portal uma pesquisa sobre aconselhamento genético, apresentando um caso fictício em junho, e agora apresenta o resultado desta pesquisa. 

Um  homem assintomático de 45 anos de idade estava preocupado sobre seu risco de câncer e pediu a seu médico informações sobre triagem genética. Dois especialistas na área apresentaram seus pontos de vista se recomendariam a triagem genética em uma pessoa assintomática e, caso o rastreio fosse recomendado, se um painel de genes de câncer ou todo o genoma deve ser sequenciado. Foi solicitado aos leitores responderem se eles recomendariam testes genéticos e, em caso afirmativo, qual o tipo.

Leia o caso clínico (tradução livre):

Jim Mathis é um homem consciente, saudável, de 45 anos, que tem sido um paciente de medicina interna/ atenção primária por vários anos. Na visita de hoje, ele fala sobre a árvore genealógica que ele desenhou e sua descoberta de que três de seus parentes tinha câncer - um tinha câncer de mama, um câncer de ovário, e um câncer de próstata. 
Normalmente, o Sr. Mathis não é um paciente ansioso, mas ele tem muita atenção a sua saúde. Ele se exercita regularmente e corre em meias-maratonas com sua esposa durante os fins de semana em família. Ele é atento à sua dieta, entende muitos termos médicos, e conhece os resultados de seus exames laboratoriais mais recentes. Ele vê seu médico duas vezes por ano para o exame físico e para o ajuste da sua medicação para a asma induzida por exercício. Os medicamentos incluem um inalador antes do exercício e um medicamento profilático oral. Ele não tem alergias. Foi internado no hospital uma vez no ano passado por uma exacerbação da asma. No passado, as únicas condições que ele mencionou em seu histórico familiar são hipertensão e acidente vascular cerebral.
Durante a consulta de hoje, sua história familiar é revista. Mr. Mathis diz que a árvore da família foi construída em uma oficina de genealogia que ele participou depois de visitar primos na Europa. Durante uma discussão sobre a árvore genealógica com sua mãe de 70 anos, soube que sua tia tinha morrido de câncer de mama, quando ela tinha 52 anos e que seu tio teve câncer de próstata fatal. Outro parente do sexo feminino teve câncer de ovário, mas sua mãe não conseguia lembrar qual parente teve câncer ou qual foi o desfecho. Ele diz que tem lido sobre o seqüenciamento completo do genoma, que ele define como a determinação da sequência de DNA de todo o material genético de uma pessoa. 
Ele pergunta sobre o teste genético e sobre as medidas preventivas que pode tomar "antes que o câncer me receba." Você diz a Mr. Mathis que a triagem genética pode ser realizada para identificar a susceptibilidade genética ao câncer, com a utilização de painéis de genes do câncer, ou para identificar a susceptibilidade genética para doenças genéticas, assim como o câncer, o que envolveria todo o sequenciamento do genoma. 

Quer dar a sua opinião? 

Comente o caso acima na seção de comentários do blog, ao final desta postagem.

Se quiser, acesse este link e veja dois artigos de opinião de especialistasselecionados pelo NEJM sobre o caso acima.


Os resultados da pesquisa

Leitores de 77 países votaram; 42% dos eleitores eram dos Estados Unidos. 

Dos 929 leitores que votaram, 40% não realizariam qualquer teste genético. Entre os 60% de leitores que recomendariam o teste, 47% escolheria triagem limitada pelo sequenciamento apenas de genes do câncer e os demais 12% dos votantes sequenciariam o genoma inteiro.



Entre os leitores norte-americanos, 37% não realizaria algum teste genético, 46% triaria somente genes do câncer de susceptibilidade, e 17% recomendam a triagem todo o genoma. Os votos dos outros 76 países seguiram um padrão semelhante.


Leitores fizeram comentários acerca do caso

Embora a maioria dos respondentes solicitasse testes genéticos, a maior parte dos 74 leitores que, além de votar, comentaram o caso expressaram reservas, questionando a adequação de rastreio genético de qualquer espécie. 

Houve interesse em obter mais informações sobre a história familiar para avaliar o risco hereditário de câncer, mas a maioria dos que comentaram acreditava que a triagem genética seria provavelmente inútil. Muitas perguntas sobre a abordagem de um resultado positivo foram levantadas, tais quais: 
  • Como é que o risco de câncer pode ser explicado? 
  • Será que as terapias que prolongam a vida preventivas ou outras estarão disponíveis? 
  • Será que o Sr. Mathis será sujeito a intervenções desnecessárias? 
  • Será que ele terá ao longo da vida, ansiedade potencialmente injustificada? 


Aqueles que acreditavam que a seleção genética - do Sr. Mathis ou de sua mãe - era uma opção razoável advertiram que eles poderiam tomar uma decisão informada sobre o teste, realizando-o apenas se recebessem aconselhamento com uma explicação detalhada sobre os riscos, benefícios e custos. 

Os comentários discorreram sobre vários outros pontos tais como: 
  • Um resultado de teste normal poderia trazer uma falsa confiança quanto ao risco;
  • O aspecto financeiro de testes genéticos, a partir do custo da triagem para potenciais custos posteriores se o rastreamento mostrasse aumento do risco; 
  • As diferenças de acessibilidade dos testes genéticos em várias partes do mundo, o potencial para a discriminação com base nos resultados do teste; 
  • A necessidade de uma maior capacitação para médicos generalistas (no sentido inglês da palavra, ou seja, médicos gerais mas especialistas em áreas básicas) sobre testes genéticos;
  • Não saber sobre o risco genético poderia ser mais prejudicial do que saber.

Os autores concluem

Segundo os autores, os resultados diversos dessa pesquisa refletem, em parte, as preocupações com o teste genético e o sequenciamento do genoma em pessoas assintomáticas que não têm um forte histórico familiar de doenças para as quais não são conhecidas as variantes de risco genéticos e tratamentos disponíveis. 

Eles afirmam que os benefícios potenciais de tal seleção somente poderão ser avaliados através de ensaios clínicos robustos com longo prazo de seguimento. Porém, como o custo de sequenciamento de DNA está em queda com o  conhecimento sobre o risco genético aumentando, o caso fictício poderá se tornar comum em consultórios


Acesse o artigo com os resultados da pesquisa em:



Publicado originalmente por Leonardo Savassi em http://medicinadefamiliabr.blogspot.com