sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Na opinião dos usuários, a Atenção Básica vai bem. Pórem…

Artigo do diretor do DAB analisa resultados da pesquisa da Ouvidoria Geral do SUS


Em artigo intitulado "Na opinião dos usuários, a Atenção Básica vai bem. Pórem…", Heider Aurélio Pinto - diretor do Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde e médico especialista em saúde coletiva - analisou os resultados da Pesquisa de Avaliação dos Usuários sobre a Atenção Básica, feita pela Ouvidoria Geral do SUS (SEGEP/MS).

A pesquisa foi realizada no primeiro semestre de 2012 e investigou a satisfação com cidadãos usuários e "não usuários" do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto aos aspectos de acesso e qualidade percebida na atenção à saúde, mediante inquérito amostral.

Heider  começa por discutir o que significa ser ou não usuário do SUS, tendo em vista que, pela amplitude dos serviços realizados no âmbito do SUS, todos são usuários do sistema. A referência a cidadãos usuários e "não usuários" diz respeito aos que tiveram contato com alguma atividade assistencial prestada pelo SUS.

Esse recorte, conforme mostra em seu artigo, permite enxergar que os "não usuários" do SUS tem uma avaliação pior sobre o sistema de saúde em relação àqueles que são efetivamente atendidos pelo SUS. E a diferença é atribuída, segundo o autor, a uma repetição do discurso corrente na grande mídia a respeito do atendimento prestado pelo SUS.

A pesquisa foi realizada pelo Departamento de Ouvidoria Geral do SUS (DOGES) e ouviu mais de 26 mil cidadãos acima de dezesseis anos em todo o país, que tinham ou não usado o SUS nos últimos 12 meses para vacinação, consultas, exames, atendimento de urgência, internação ou medicamentos. A amostra foi construída com o objetivo de avaliar a situação do país como um todo e de cada uma das capitais do Brasil e das cidades com mais de 500 mil habitantes.Essa avaliação do acesso e da satisfação da atenção básica na visão dos cidadãos brasileiros é a maior já realizada no país.

Essa pesquisa que tem a pretensão de ser periódica, visando  contribuir para o acompanhamento e a evolução do acesso e da qualidade na atenção básica, além de traçar tendências e orientar a tomada de decisões futuras. Essa é a ideia da “ouvidoria ativa”, enfatizada pelo Ministro Alexandre Padilha como fundamental para a formulação e planejamento de políticas públicas.

O artigo foi publicado em três partes: Na primeira,  Heider Aurélio Pinto discute  "Usuários e não usuários do SUS"; a seguir aborda o acesso, discutindo tempo de espera, distância percorrida pelos usuários para acessar uma unidade de saúde, dentre outras; por fim, analisa a satisfação de quem usou e quem não usou o SUS, especificamente abordando a satisfação com os profissionais e com os serviços, além da questão da prescrição de medicamentos e da relação da atenção básica com a rede de serviços.

Outras avaliações de acesso e satisfação já foram feitas, e esta avaliação "contribui para desfazer muitos mitos que de tanto se repetirem parecem ser verdade", afirma o diretor do DAB.

Leia o artigo na íntegra:



segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Rede de Pesquisas em APS entrevista Nulvio Lermen Jr


Núlvio é graduado em medicina pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) com especialidade em MFC pela Universidade de Pernambuco (UFPE).Mestre em Políticas e Gestão em Saúde pela Universidade de Bolonha – Itália. Foi coordenador de Gestão da Atenção Básica do Ministério da Saúde entre 2007 e 2011.Atualmente é Coordenador de Saúde da Família do município do Rio de Janeiro e presidente da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (gestão 2012-2014).


1) Nos últimos anos, foi relevante o crescimento da atenção primária no Brasil. Em sua opinião, quais foram os maiores avanços?
Um sistema de saúde construído a partir da atenção primária deve ser estruturado por meio dos seus quatro atributos principais: o acesso, a integralidade, a longitudinalidade e a coordenação do cuidado. No Brasil, indubitavelmente, o maior avanço que tivemos foi no acesso aos serviços de saúde. Hoje contamos com mais de 33 mil equipes de Saúde da Família (eSF) levando o cuidado à saúde para mais próximo da população. Se compararmos ao que tínhamos há 15 anos, é um progresso enorme.Quando fixamos em outros atributos, também tivemos melhorias, com destaque ao campo da integralidade, já que trabalhamos com base em equipes multiprofissionais, muitas delas com o apoio dos NASF, o que é um diferencial em relação à APS adotada em muitos países. Quanto à longitudinalidade e à coordenação do cuidado, os avanços foram mais discretos por questões próprias do nosso país e do nosso sistema de saúde. Temos muito a trabalhar para fortalecer essas características e, para isso, devemos focar mais especificamente em ações que visem a melhorar a fixação dos profissionais na APS e a estruturação dos serviços, assim como a sua articulação com a rede.

2) E quais as vantagens de se organizar os serviços de APS com base na Estratégia Saúde da Família?
A Estratégia Saúde da Família (ESF) foi construída com base em características que internacionalmente estão relacionadas com melhores resultados em saúde, destacando-se: a base em uma equipe multiprofissional, a presença de profissionais generalistas e a proximidade com a comunidade. Agregando-se a isso se adicionaram mais duas características que internamente no nosso país já mostravam resultados: a base territorial e a participação comunitária por meio da presença dos agentes comunitários de saúde (ACS). Sendo assim, é uma proposta bastante completa e que pode ser adaptada para as realidades locais visando a dar resposta às necessidades específicas de cada população.

3) Quais serão seus maiores desafios como presidente da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade?
A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) trabalha hoje em diversas frentes e, por isso, apontar um maior desafio não é tarefa fácil pelo risco de deixar de valorizar alguma ação estratégica. Pensando no âmbito geral, entendo que o principal desafio ou meta da sociedade sempre deve ser o fortalecimento da Medicina de Família e Comunidade (MFC) no País. E, para isso, deveremos trabalhar em alguns eixos com suas respectivas atividades, tais como:
•           Eixo político – garantir a representatividade da especialidade junto aos pares e às entidades que desempenham ações relevantes para os nossos associados.
•           Eixo administrativo – ampliar a base de associados e expandir o número de associações estaduais.
•           Eixo de projetos estratégicos – ampliar a produção de materiais científicos e apoiar as ações para a expansão do número de especialistas em MFC no Brasil (residência e titulação).
•           Eixo de comunicação – ampliar as ações que busquem a divulgação e valorização da especialidade.
•           Eixo de eventos – realizar com qualidade os eventos previstos para o período (Congresso Brasileiro de MFC em Belém, no ano de 2013, e Congresso Mundial de Medicina Rural, em Gramado, no ano de 2014).

4) O Rio de Janeiro está com um programa para médicos residentes em Medicina de Família e Comunidade que é apoiado pela sociedade. Poderia falar mais sobre o projeto?
Hoje o município do Rio de Janeiro é o maior exemplo de que, com vontade política, investimento e planejamento, é possível transformar um sistema de saúde baseado em hospitais em um sistema fortemente baseado na APS em um curto espaço de tempo. Pouco tempo atrás, o município contava com aproximadamente 60 equipes de Saúde da Família que cobriam menos de 4% da população; nos últimos três anos, foi realizada uma verdadeira revolução em seu sistema, passando para mais de 700 equipes completas e uma cobertura superior a 35% da população, com previsão de continuidade dessa expansão nos próximos anos. Nesse cenário, fez-se necessário que fossem trabalhadas várias questões satélites que interferem diretamente na qualidade dos serviços ofertados para a população, entre elas a estrutura física das unidades, a adequação dos equipamentos, a informatização dos serviços e, especialmente, a qualificação dos profissionais, com consequente valorização daqueles que têm formação para atuação na área. Sendo assim, o município, entre outras ações, decidiu investir fortemente na formação dos profissionais para atuarem em seu sistema de saúde.
Nessa perspectiva, no ano de 2011, na área médica, o Rio de Janeiro investiu em duas frentes visando a ampliar as vagas de residência em Medicina de Família e Comunidade: trabalhou, junto aos três programas já existentes no município (UERJ, EFRJ e ENSP), na expansão do número de vagas neles e criou um programa de residência próprio que viria a ser o maior programa de residência em MFC do País, com 60 vagas para R1 por ano. Com isso, o Rio de Janeiro, em 2011, que contava com 18 vagas para residentes do primeiro ano, passou a ter 98 vagas em 2012. Evidenciando o sucesso da ação, a taxa de ocupação das vagas de residência em MFC no município é a mais alta entre as grandes capitais, e a expectativa para o ano de 2013 é de expansão do número e da ocupação dessas vagas. Esse sucesso pode ser creditado a algumas ações adotadas pelo município, como a inserção precoce dos acadêmicos das sete universidades com curso de Medicina no município nas unidades de APS, a estruturação da rede e dos locais que servem de campo de estágio para a residência, o pagamento diferenciado para os profissionais com formação para atuação na APS (no caso do médico, o MFC) e, finalmente, o pagamento de uma complementação financeira para os residentes em MFC, já que eles atuam junto às eSF do município. Com isso, a cidade espera chegar a mais de 400 médicos de Família e Comunidade formados ou em formação até o fim de 2016.

5) Um dos problemas para o fortalecimento da atenção primária está na contratação de profissionais, principalmente de médicos. Como solucionar essa questão?

Esse é um assunto complexo e que demanda um conjunto de ações em longo prazo. O mais importante para que isso se concretize é a valorização do profissional que atua na Atenção Primária à Saúde. Quando falamos em valorização, não quer dizer somente financeira, mas também social. Nisso vários fatores influenciam, desde a melhoria dos espaços de trabalho e equipamentos, a melhoria do acesso a exames complementares e de diagnóstico e a melhoria da integração com os outros serviços da rede, até a possibilidade de aperfeiçoamento profissional continuado a todos os profissionais.Se quisermos ter êxito na fixação desses profissionais, é preciso que isso seja visto como prioridade no plano nacional, pois ações isoladas municipais mostram que é possível ter sucesso nessa questão, mas, se não forem sustentadas ao longo do tempo por uma política de Estado, acabarão por se dissolver ao gosto das mudanças de governo inerentes ao processo democrático.


6) Como presidente da SBMFC e novo integrante do comitê coordenador, como você vê o papel da Rede de Pesquisa em APS?
A meu ver, a Rede de Pesquisa em APS pode e deve desempenhar um papel fundamental para a APS e, consequentemente, para o SUS como um todo. Ela é essencial na criação de um arcabouço de evidências científicas que, se bem utilizadas pelos gestores do nosso sistema, podem guiar os rumos das nossas políticas públicas para o setor. Dentro desse âmbito, a Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, como representante dos profissionais médicos que atuam na APS, pretende participar ativamente da rede, pois entendemos que a integração entre a pesquisa e o serviço é essencial para o crescimento do SUS.


Publicado originalmente e enviado por email pela Rede APS